Paula Costa
Há 12 anos vivendo na comunidade do Sereno, a diarista Maria Sueli aproveitou a manhã deste sábado, dia 31, para tirar a segunda via da carteira de identidade pertinho de casa. E mesmo sem ter levado fotos 3x4 para dar entrada no documento, ele não teve dificuldades para fazer as imagens ali mesmo.
Tamanha facilidade só foi possível graças ao projeto Sesi Cidadania. O programa está presente em todas as áreas pacificadas do Rio de Janeiro e já realizou mais de 500 mil atendimentos. O objetivo é levar educação, esporte, lazer, cultura e cidadania à população que vive nessas regiões.
“Sou do Ceará e perdi meus documentos na viagem de vinda ao Rio”, explicou Sueli enquanto era atendida.
“Desde que moro aqui estou sem identidade. E já tentei resolver antes, mas era muito difícil. Tinha que ligar e pegar senha. Eu não conseguia. Mas hoje saio daqui com isso solucionado”, comemorou a moradora.
A possibilidade de reunir num mesmo local diversos serviços para a população é o que faz do Sesi Cidadania um projeto tão especial. “É um evento que tem uma importância primordial para a continuação do processo de pacificação”, declarou o comandante da UPP Fé e Sereno, capitão Leo Ludolff.
“A polícia não pode entrar sozinha na comunidade. É necessário que aconteça esse tipo de evento. Precisamos do apoio de mais órgãos e também da sociedade civil organizada”, justificou o comandante, para quem o Sesi tem sido um “grande parceiro” das UPPs no programa de pacificação.
Mesmo sob o sol forte, os moradores da comunidade não se incomodaram em enfrentar algumas filas para colocar em dia velhas pendências. De acordo com o Sesi, a maior procura do encontro no Sereno foi por serviços de regularização de documentos, como o caso da moradora Sueli.
“É um evento que traz um serviço que a comunidade tinha muita carência. Hoje, na fila, tem muita gente sem os documentos pessoais. O maior valor nesse momento é trazer identidade para os moradores”, explicou a coordenadora do Sesi Cidadania nas comunidade Fé, Sereno e Paz, Shirlane Curty.
“A importância é resgatar a cidadania para essa comunidade. Junto com os nossos parceiros isso é possível”, garantiu o gerente operacional do programa Sesi Cidadania, José Francisco Pelka, referindo-se ao trabalho de órgãos como Detran (emissão de carteiras de identidade), Setrab (emissão de carteiras de trabalho), Correios (cadastro de CPF) e Defensoria Pública do RJ (esclarecendo dúvidas sobre assuntos jurídicos).
Capacitação profissional
Pelka lembrou que o Sesi Cidadania também oferece oportunidades de capacitação profissional para os moradores. “Temos exemplos de pessoas que estavam passando, mas viram a oferta de um curso, se interessaram e hoje têm uma renda extra”, exemplificou.
Neste sábado, o Sesi ofereceu cursos de aceleração de conclusão do Ensino Médio e Fundamental para jovens e adultos. Já os cursos de capacitação apresentaram até 30 opções de aulas, em segmentos tão variados como mecânica, eletricidade, tecnologia da informação e gestão.
“Hoje estamos fazendo a divulgação dos cursos. Até agora os moradores mostraram mais interesse pelos cursos de eletricista de baixa tensão e mecânica de motor para carro de passeio”, comentou a pedagoga Camila da Silva.
As inscrições ainda estão abertas e podem ser feitas pelo site do Pronatec. As aulas serão realizadas na ONG Atitude Social ou na unidade do Sesi/Senai, que fica na Av. Vicente Carvalho, no bairro de mesmo nome.
Além do resgate à cidadania, o dia no Sereno também foi de diversão, com oficinas de artesanato, gesso, pintura e entretenimento para as crianças.
“Sou nascida e criada aqui na comunidade. Antes, não tinha nada para os moradores. Se acontecia alguma coisa nos morros, era na Zona Sul”, comentou a dona de casa Claudia Gomes, que tirou o sábado para brincar com os filhos Lander Izaias, de 8 anos, e Isaac Lander, 6, numa oficina de pintura de gesso.
“Eu não deixava meus filhos participarem de nada na comunidade porque não me sentia segura. Já perdi um filho para a violência. Se ele estivesse vivo, estaria com 25 anos. Hoje, temos outra realidade. A sociedade está reconhecendo a comunidade”, disse.
“Como sempre morei aqui, vejo a transformação. Para os meus filhos, os policiais são heróis. Eles já até fizeram carta para agradecer a segurança. Acham o máximo as viaturas pelas ruas”, contou ela, que também buscava informações sobre cursos de informática para moradores da comunidade.
“Nós cobramos os deveres, mas também temos que trazer os direitos. A dignidade humana e a qualidade de vida”, afirmou o Capitão Ludolff.
“Eu considero que o maior trabalho da polícia é servir e proteger. É muito gratificante poder participar ativamente de um momento histórico como esse. A comunidade interagindo dentro da tranquilidade, em paz. Vejo que se trata de uma transição de comunidades antes esquecidas para comunidades fortes, cidadãs e com seus direitos plenamente respeitados”, concluiu.
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