Soraya Batista
Os movimentos leves e suaves de uma prática milenar de meditação oriental contrastam com o sobe-e-desce acelerado de moradores e veículos na Rocinha. É mais uma aula do Yoga na Laje, projeto implantado na comunidade logo após a pacificação, em 2012. Idealizado pelo professor Carlos Augusto D’Aguiar, de 60 anos, a iniciativa busca difundir os principais conceitos desta tradição indiana, que, além de relaxar, traz diversos benefícios para o corpo e a mente.
Carlos tinha um plano de ensinar yoga em comunidades e quando soube da chegada da UPP à Rocinha vislumbrou o cenário ideal, já que além de estar localizado em um local de fácil acesso, ofereceria a segurança necessária para os professores que abraçassem o projeto.
A coordenadora do projeto, Miriam Andreatta, conta que, inicialmente, Carlos Augusto alugou uma laje na Estrada da Gávea para oferecer aulas de yoga para as crianças da comunidade – daí o nome do projeto “Yoga na Laje”. O objetivo era proporcionar momentos de relaxamento e tranquilidade para os meninos e meninas agitados moradores da comunidade, que até pouco tempo viviam cercados por medo e violência.
Com o passar do tempo, o professor percebeu que os pais que acompanhavam as crianças demonstravam um grande interesse pelas aulas e, por isso, decidiu estender o projeto para todas as idades.
Apesar do sucesso entre os moradores e da linda vista oferecida pela laje, a realização do projeto encontrou dificuldades por conta do forte calor e das chuvas constantes, que muitas vezes inviabilizavam as aulas. O problema só foi resolvido quando a Biblioteca Parque da Rocinha chamou o grupo para uma parceria e ofereceu uma sala para as aulas de yoga.
Hoje, o projeto recebe cerca de 30 alunos matriculados e mais alguns “flutuantes”, que contam com quatro professores voluntários – alguns cedidos pelo centro Blyss, de Ipanema. Miriam conta que depois da mudança para a Biblioteca, o grupo está se reestruturando, e a ideia é captar novos alunos. Depois disso, quando o projeto estiver melhor estruturado, a ideia é levar a yoga para as lajes de outras comunidades do Rio de Janeiro.
Queremos expandir esse projeto, mas antes vamos fortalecê-lo dentro da Rocinha, aumentar os horários e os números de turmas. É um trabalho muito legal, porque o volume de estresse nas comunidades é altíssimo, mas no momento que os alunos chegam para aula, eles podem relaxar, meditar. Isso é muito importante.”
A prática
As aulas acontecem no terceiro andar da Biblioteca da Rocinha. Paula Uchôa, uma das professoras do projeto, começa falando um pouco sobre a origem do Yoga e explica que não se trata apenas de uma atividade física, mas que é uma prática muito antiga de autoconhecimento. Depois, a professora ensina posturas diferenciadas e logo após, os alunos relaxam por cerca de 10 minutos. A aula segue com uma meditação e é finalizada com a professora e os alunos entoando um mantra.
“O beneficio maior do yoga é o autoconhecimento. As pessoas normalmente tem a visão de que é um ser limitado. O yoga te dá liberdade, clareza mental, que te permite enxergar quem você é. Fora isso, tem a parte física você tem uma flexibilidade maior, conforto, pode se curar de uma lesão que tenha tido. A meditação te traz uma mente mais objetiva para você realizar suas escolhas de uma forma mais serena, e a respiração te traz mais calma. São muitos benefícios.”, explica a professora.
Moradora da comunidade da Rocinha, Luciene Muniz Pereira, 36 anos, pratica yoga há mais de um ano. Ela conta que inicialmente acompanhava o filho que fazia parte do projeto quando ainda era realizado na laje. A prática, que causou estranhamento no início, acabou conquistando seu interesse e ela decidiu começar a participar das aulas.
“Eu fui para conhecer e adorei. Os benefícios são muito bons e essa parte de alongamento me ajudou bastante. Esse trabalho de respiração é muito importante para mim, porque no dia a dia a gente corre bastante e não presta atenção nesses detalhes.”
Mário Santana, 50 anos, é servidor público e já praticava alguns exercícios sozinho em sua casa. No entanto, os comentários sobre a aula de yoga realizada na comunidade chamaram sua atenção e decidiu experimentar.
“Estou na aula de yoga há três meses e já sinto que estou bem mais relaxado. Já tinha lido alguns artigos científicos sobre os benefícios que a yoga traz para a saúde, para o corpo, e isso me incentivou a começar. Estou gostando, sinto uma leveza depois da aula, chego em casa, sento no sofá e quando me dou conta pego no sono. É um calmante natural.”
O agente de turismo Jeferson Molina, de 48 anos participou de primeira aula e pretende ser um aluno regular do projeto. Ele conta que decidiu praticar yoga porque procurava atividades que o ligasse a natureza e que permitisse sentir o mundo a sua volta.
“O yoga faz com que a gente se adapte ao mundo. Hoje em dia é tudo correria, você tem hora pra tudo,tem obrigações e com isso só temos tempo para nós mesmos na hora de dormir. Com o yoga você se busca, se encontra e eu acho isso muito importante. O homem tem que se buscar , eu me busquei e por isso vou seguir com as aulas. Acho isso muito interessante.”
As aulas acontecem todas as terças, às 10h e às 18h; quartas, às 10h e as quintas às 18h. A Biblioteca Parque da Rocinha fica localizada na Estrada da Gávea, 559, em São Conrado.