Alfredo Mergulhão
Ganhou novas cores a imagem que representa os soldados do Exército autorizando a primeira construção em alvenaria, na época em que havia apenas barracos nos morros do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho, situados na Zona Sul do Rio. Localizado no mirante, o painel em grafite é uma das 27 obras que passam por trabalho inédito de restauração iniciado em outubro pelo Museu de Favela (MUF). Esses murais compõem o Circuito Casas Telas, que retrata a saga vivida pelos pioneiros das duas comunidades.
O conjunto de obras do circuito monta um roteiro com narrativa sobre a história da ocupação do maciço do Cantagalo. E agora ele passa pela primeira vez por restauração desde que foi criado, há cinco anos. A mulher com lata d'água na cabeça e o homem acompanhando as manifestações culturais afrobrasileiras também foram retocadas com tintura de mais brilho e resistente às intempéries.

Agora, esses murais parecem novos e nem lembram que estão expostos nos becos desde 2010. "A comunidade é muito adensada. A todo momento passa gente pelas obras, alguns rabiscam, outros esbarram os carrinhos de compras e acabam riscando as paredes. Então elas estavam deterioradas", diz Sidney Silva, morador do Cantagalo e diretor do MUF. O restauro é financiado pela Secretaria de Estado da Cultura e também contempla dois portais localizados nas entradas das comunidades.
Nos próximos meses, todos os 27 painéis estarão renovadas. "Como é uma exposição permanente, a céu aberto, ela tem uma dinâmica diferente de conservação, porque as obras estão expostas ao sol e à chuva", explica a museóloga Clarisse Rosa, do MUF. O ineditismo do trabalho está no fato de restaurar obras em grafite, um tipo de arte caracterizada pela efemeridade.
Diretor do MUF e professor de Museologia da Unirio, o professor Mário Chagas explica que as obras deixaram de ser individuais e passaram a ser coletivas, pertencendo também aos moradores. "Ela continua sendo autoral, mas suporta a memória do morador. Muitos se veem retratados nos grafites das casas", diz.

O roteiro das Casas Tela surgiu a partir das obras do artista Carlos Esquivel Gomes da Silva, o Acme. Sete obras do grafiteiro - que já existiam - foram incorporadas ao circuito e outras 20 foram criadas por artistas convidados, dentro do Programa de Modernização dos Museus do Ministério da Cultura, em 2009. Acme foi o curador e agora é responsável pela coordenação do restauro.
Para a comunidade, renovar essas obras significa manter a sustentabilidade do MUF. O museu oferece serviço de visitas acompanhadas que incluem o passeio pelas Casas Tela, em um trajeto de exatos 2.050 passos dados entre as vielas das comunidades. A história contada nos murais complementa o trabalho de guiamento. "Para fazer sentido, a visitação precisa ser acompanhada pelos guias locais, que contarão a história da comunidade. Esse é outro diferencial do MUF", afirma Mário Chagas.
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